Um técnico em agrimensura, ex-funcionário da Eletrosul (Centrais Elétricas do Sul do Brasil S.A), receberá indenização por danos materiais e morais .por ter sido demitido dois dias depois de ser reintegrado ao emprego por força de decisão judicial. A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou conhecimento ao recurso da Tractebel Energia S.A., sucessora da Eletrosul., mantendo a decisão de segunda instância.
A empresa foi condenada a pagar R$ 3.643,23 pelas despesas realizadas pelo ex-empregado para reassumir o emprego, com a mudança dele e da família de Itabuna (BA) para Florianópolis (SC), e R$ 20 mil por dano moral. O valor foi arbitrado em novembro de 2001 pelo Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina (12ª Região).
O técnico havia se mudado de Florianópolis para Itabuna depois da demissão ocorrida em 1992. Quando saiu a decisão judicial de reintegração, ele pediu dispensa do emprego na prefeitura, contraiu dívidas com amigos e banco, comprou passagens de avião e providenciou a mudança para assumir o antigo posto de trabalho. A reintegração, em 17 de janeiro de 2000, foi fundamentada na Lei 8.878/94 que anistiou os servidores e empregados públicos de órgãos e empresas sob controle da União demitidos pelo governo Collor no plano de privatização e enxugamento do serviço público.
Geradora privada de energia elétrica, com sede central em Florianópolis, a Tractebel recorreu contra decisão da segunda instância, com o argumento de que a demissão foi efetivada no “exercício regular de direito” da empregadora. Também alegou que não há previsão legal sobre o período mínimo de contratação a partir do qual é autorizada a despedida do empregado.
Ao negar conhecimento ao recurso da Tractebel, o relator do recurso, ministro Lelio Bentes, destacou a decisão do TRT-SC na qual se reconhece a legalidade do ato de demitir empregados, sem que resulte em direito à indenização por dano moral. No caso do técnico em agrimensura, entretanto, considerou-se que a empregadora extrapolou os limites desse poder chamado potestativo, ao despedi-lo dois dias após a readmissão determinada por sentença transitada em julgado.
Essa conduta da empresa, segundo o TRT-SC, “além de imoral”, evidenciou “afronta à dignidade da justiça” e desprezo para com o Poder Judiciário e também para com dignidade do trabalhador, além de violação dos direitos subjetivos inerentes à pessoa, “tais como a reputação, a honra, a imagem e a dignidade, configurando o dano moral de natureza grave”. “A honra e a imagem de qualquer pessoa são invioláveis (artigo 5º, X, Constituição) e, no âmbito do contrato de trabalho, essa inviolabilidade assume expressão de maior relevo porque o empregado depende da sua força de trabalho para sobreviver”, assinalou.
No recurso, a Tractebel aponta violação do artigo 487 da CLT que trata do aviso prévio na demissão sem justa causa. Lelio Bentes afirmou que esse dispositivo legal não foi examinado pela segunda instância, “até mesmo porque não tem relação com o tema ora disicutivo”.
O ministro também rejeitou a alegação de violação ao artigo 160 (I) do Código Civil que descaracteriza como ato ilícito aqueles praticados “no exercício regular de um direito reconhecido”. O relator ressaltou que a segunda instância proferiu a condenação por considerar ter havido extrapolação dos limites do direito de demissão. Para chegar-se a uma conclusão diversa, seria necessário o reexame de provas e fatos, o que é vedado quando se trata de recurso revista ao TST, afirmou.
A Tractebel recorreu também contra a condenação por dano material com alegação de não haver provas no processo. Também em relação a esse aspecto, a Primeira Turma do TST negou conhecimento ao recurso. O ministro Lélio Bentes observou que a decisão do TRT, em relação à indenização dos danos materiais, foi adotada com base na sentença de primeiro grau na qual estão como comprovadas as despesas do técnico. A responsabilização do empregador pelos danos materiais deveu-se à prática de “ato ilícito dos quais decorreram todos os infortúnios”. À empresa foi atribuída a responsabilidade prevista no Código Civil (artigo 159), segundo o qual aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem fica obrigado a reparar o dano”.
A segunda instância fundamentou-se no exame da prova constante no processo, independentemente “de quem a produzira, não se tratando, assim, de discussão sobre o ônus subjetivo da prova”, disse o relator, ao rejeitar uma das alegações da empresa. Segundo ele, “não há que se confundir a avaliação da prova, que é tema de interpretação, com inversão do ônus da prova, que é tema processual”. (RR 51372/2002)