A juíza Cristiana Soares Campos, da 28ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, condenou uma rede de laboratórios ao pagamento de indenização por danos morais a uma atendente que sofreu bullying no ambiente de trabalho. A decisão também reconheceu seu direito à indenização substitutiva por estabilidade provisória decorrente de doença ocupacional.
Contexto e relato da trabalhadora
A atendente entrou com ação trabalhista relatando que possui TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade). Essa condição, somada à pressão e sobrecarga no trabalho, desencadeou crises de ansiedade e posteriormente um transtorno psíquico. A profissional alegou ter sido vítima de assédio moral por colegas, que a chamavam de “lerda” e “sonsa” e afirmavam que ela “se fazia de sonsa para sobreviver”. Ela ainda contou que recebeu um “troféu” por ser considerada “a empregada mais lerda do setor”.
Defesa da empresa
A empresa negou qualquer relação entre as atividades laborais e a doença da funcionária, além de repudiar acusações de assédio moral.
Investigação e provas
A juíza constatou a existência de atos discriminatórios repetidos, motivados por suposta baixa produtividade da atendente. Documentos no processo comprovaram a realização de “ranqueamentos” e a entrega de “premiações” depreciativas à vítima.
A perícia médica indicou que a trabalhadora desenvolveu transtorno ansioso-depressivo multifatorial, provocado e agravado por estressores do ambiente de trabalho. O bullying sofreu teve papel determinante na origem e piora do quadro psíquico, configurando nexo concausal — isto é, a doença foi causada tanto por fatores pessoais quanto laborais.
Testemunhas reforçaram a conclusão, especialmente o chefe da autora, que confirmou que a chefia sabia da violência psicológica e que nenhuma medida efetiva foi tomada para coibi-la.
Fundamentação da sentença
A juíza destacou que cabe ao empregador assegurar um ambiente de trabalho saudável, adotando medidas eficazes para prevenir e reprimir a violência psicológica, como suspensão disciplinar ou até demissão por justa causa, caso necessário.
Neste caso, apesar do conhecimento da prática reiterada de bullying — evidenciado pela entrega do “certificado” e “troféu” — a empresa permaneceu passiva, configurando omissão e, assim, assumindo o risco da responsabilização civil pelo dano causado.
A perícia médica reforçou que o transtorno da trabalhadora agravou-se em decorrência da intensidade da violência psicológica, que foi tão grave a ponto de exigir afastamento do trabalho por três meses para tratamento.
Referências normativas e conceituais
A decisão mencionou o Protocolo de Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória do Tribunal Superior do Trabalho, que define violência psicológica como qualquer conduta que cause dano emocional, diminua a autoestima ou prejudique o pleno desenvolvimento da pessoa, incluindo gestões por manipulação, pressão ou discriminação.
O assédio moral é conceituado como condutas abusivas que atentam contra a dignidade do trabalhador, por meio da degradação das relações profissionais e do ambiente laboral.
Estabilidade provisória e indenização
Foi reconhecido o direito da autora à estabilidade provisória de 12 meses prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/1991, por conta do nexo concausal entre a doença ocupacional e o trabalho. Como a funcionária já havia sido desligada, a empresa foi condenada a pagar indenização substitutiva, além das verbas rescisórias.
Quanto ao dano moral, o valor inicialmente fixado em R$ 50 mil foi reduzido para R$ 20 mil pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, considerando extensão do dano, capacidade econômica, caráter pedagógico e jurisprudência. O processo segue para análise no Tribunal Superior do Trabalho.
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