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Emendas dão espaço para negociação entre deputados e empresas, diz especialista

Por dois anos, o antropólogo Marcos Otávio Bezerra percorreu os corredores do Congresso Nacional pesquisando a forma como funcionava a Comissão Mista de Orçamento. Descobriu um grupo de empresas que negocia com os parlamentares emendas para municípios, o que está relatado em seu livro Em Nome das Bases – Política, Favor e Dependência Pessoal.

Interessado em uma participação no negócio ou apenas no ganho eleitoral que podem ter com uma emenda, parlamentares são a ponta do esquema dentro do Congresso Nacional. “Os parlamentares procurados costumam ter representantes ou algum tipo de vinculação política com determinado município”, explica Bezerra.

A própria emenda do parlamentar é vista por seus eleitores como “legítima”, acredita Bezerra. “Essa é a concepção do bom político, é o que consegue levar um hospital para um município, que consegue asfaltar uma rua”. Segundo o antropólogo, isso está ligado à idéia de que o representante no Congresso deve trazer benefícios para a população.

A empresa, segundo o antropólogo, fica responsável por elaborar uma proposta de emenda pelo deputado ou senador. “A liberação de emendas faz com que o parlamentar possa contar, no momento da reeleição da candidatura, com o apoio político desse prefeito”.

Em sua pesquisa, Bezerra descobriu outras formas de se conseguir recursos para determinado município. Uma delas é a criação de empresas pelos próprios parlamentares em função do mandato parlamentar. Elas funcionam, muitas vezes, como ponte até os municípios.

Em outros casos, essas entidades são administradas por empresários, que podem ter ou não ligação com o deputado ou senador. A partir daí, entram em contato com o político propondo algum tipo de comissão ou de ganho econômico com a apresentação de emendas feitas no Congresso Nacional.

Foi o caso, segundo Bezerra, do esquema de compra superfaturada de ambulâncias investigado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Sanguessugas.

O dona da empresa Planam, Luiz Antônio Vedoin, aproximava-se de parlamentares que haviam apresentado emendas, segundo a CPMI, para propor o direcionamento de sua execução, mediante a promessa do pagamento de propina.

Como o orçamento aprovado no Congresso não precisa ser seguido à risca pelo Poder Executivo, os lobistas costumam atuar em outra ponta: a execução pelo governo da obra prevista em emenda. “Essas empresas atuam também dentro dos ministérios, para que os processos possam andar mais rápido. Muitas vezes são estabelecidos acordos com funcionários dentro dos órgãos para cuidarem dos processos de interesse dessas empresas”.

Apesar dos problemas, Bezerra vê avanços no processo de elaboração do Orçamento. Cita o Sistema Integrado de Acompanhamento Financeiro (Siaf), que permite aos parlamentares acompanharem a execução das emendas. O antropólogo também destaca que a sociedade está mais consciente de que o Orçamento é a principal definição do trato de dinheiro público.