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Jobim destaca papel do Supremo na garantia das liberdades

O impacto das decisões do Supremo na economia e na opinião pública brasileira e o papel da Corte na defesa das liberdades individuais foram tema do discurso proferido pelo presidente do STF, ministro Nelson Jobim, na abertura do Ano Judiciário. A cerimônia foi realizada na manhã desta quarta-feira (1º), no plenário do Supremo, e contou com a presença dos presidentes da República, Luiz Inácio Lula da Silva, do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Aldo Rebelo, entre outras autoridades.

Jobim lembrou que o Supremo é, freqüentemente, alvo de críticas daqueles que não têm suas demandas atendidas. “A experiência indica, muitas vezes, que atender às pretensões dos postulantes é o caminho fácil para o aplauso e o reconhecimento. Noutros casos, decidir contra a suposta vontade da maioria, da ‘opinião pública’, significa a exposição à ira de alguns poderosos e a toda sorte de ilações conspiratórias”, afirmou. “Esquecem que o Supremo nunca se curvou e nunca irá se curvar a patrulhamentos de nenhum tipo, públicos ou privados”, concluiu.

Íntegra do discurso do ministro Jobim na abertura do Ano Judiciário :

Discurso de abertura do ano judiciário 2006, proferido peloPresidente do supremo, ministro nelson jobim, no dia 1º de fevereiroExcelentíssimo senhor presidente da república,Excelentíssimo senhor presidente do congresso nacional,Excelentíssimo senhor presidente da câmara dos deputados,Senhor procurador-geral da república, colegas, excelências,Minhas senhoras e meus senhores,Reunimo-nos para a inauguração do ano judiciário 2006, eventoCriado oportunamente pelo extraordinário ministro maurício corrêa.Creio que este momento é importatne para algumas meditações.Temos que ter presente a inserção e a função do supremo no estadoBrasileiro.Há que se partir dos fatos e não de idealizações.As demandas que aqui aportam são, em linhas gerais, e nósMinistros já sabemos, são, em linhas gerais, de três modalidades. Perdoem-meQue faço tentantiva de classificação:= as de fazenda;= as de políticas públicas; e= as de liberdades.Um caso concreto pode integrar os três conjuntos, com eventualPrevalência de um deles.O conjunto fazenda compreende as demandas relativas às receitas eÀs despesas públicas.Os contribuintes pretendem redução de suas obrigações fiscais.Tem repercussão, para menos, na receita pública.São demandas sobre impostos e contribuições sociais.Muitas vezes, aproveitam-se da morosidade judiciária para adiar aLiquidação de obrigação fiscal.Noutras, insurgem-se, com razão, contra a elevada cargaTributária brasileira.Outros, por sua vez, querem o aumento das obrigações do estado.A repercusão, aqui, é no lado da despesa pública.São demandas de servidores, segurados da previdência; credores,Enfim, do estado.Aqui temos, ainda, demandas em que é o estado que se apropria doEspaço judiciário para rolar dívidas públicas.Já o segundo conjunto, das políticas públicas compreende demandasCom viés claramente político.São seus atores principais:

= os partidos políticos;= os sindicatos; e= as corporações.

Alguns partidos, derrotados no congresso nacional, na votaçãoDemocrática, modelo da nossa estrutura política, procuram tribunalizar asPolíticas públicas aprovadas pela maioria.Algumas corporações e sindicatos, por sua vez, opõem-se a essasMesmas políticas, porque foram atingidos interesses de seus integrantes.Em ambos os casos, há a tentativa de erigir o supremo em julgadorDa conveniência e oportunidade de tais políticas, aprovadas no debatePolítico do congresso nacional.Por fim, o conjunto das liberdades.Aqui, estão as demandas de proteção às garantias individuais.São habeas-corpus e mandados de segurança que trazem ao supremoObjeções às condutas e decisõesDos tribunais;Do ministério público;Das comissões parlamentares de Inquérito;Enfim, das autoridades públicas.Diante de tudo isso, dessa síntese rápida que fazemos, aflora umaQuestão para urgente debate.Qual o paradigma que deve orientar a atuação do supremo naPreservação da constituição?A resposta acadêmica é tipicamente tautológica:

= é a preservação da constituição.

Diante de demandas concretas tal afirmação não tem sentido, nadaSignifica, nada orienta.É insuficiente.Em vez de esclarecer, esconde.A experiência indica, muitas vezes, que atender às pretensões dePostulantes é o caminho fácil para o aplauso e o reconhecimento.Em outros casos, decidir contra a suposta vontade da maioria, da“opinião pública”, significa exposição a iras de alguns poderosos.Significa exposição à toda sorte de ilações conspiratórias e,Aqui, muito conhecidas e injustas.Esquecem que o supremo nunca se curvou e não irá se curvar aPatrulhamentos de nenhum tipo, públicos ou privados.É extraordinária a repercussão e o elogio a decisões

= que reduzem a receita pública,

= que aumentem as despesas;

= que dificultem a implantação de políticas públicasAprovadas pelos parlamentos.

É o aplauso fácil.É o elogio rasgado.Mas, para as decisões de proteção das liberdades e garantiasIndividuais, a situação é distinta.O repúdio rouba o lugar do aplauso.Repudiam-se as decisões do supremo que garantem as liberdades,Tudo em nome da segurança, da repressão ao crime, do combate à corrupção…Mas, na verdade, a história mostra que o ato arbitrário éMaterialmente o mesmo.Os atores é que mudaram.O fundamento também mudou, ministro pertence.Ontem, era a “segurança nacional”.Hoje, dentre outros, pode ser o “clamor público”.Em outros países, vemos lamentável quebra de garantias, direitosE liberdades, em nome do combate ao terrorismo.Lá tanto quanto cá, investigações ilimitadas e intermiáveis,Investigações que acabam se tornando fim em si mesmo, inquisições,Exposições públicas, invasões à privacidade e presunções absolutas de culpaConstituem retrocesso com o qual a magistratura brasileira não podeCompactuar.Não queremos a barbárie em nome dos “superiores interesses doEstado”.O supremo, na sua história, sobretudo depois de 1988, tem claro oParadigma capaz de ajudar a resolver esta tensão dialética.É a “governabilidade democrática”.Não se confunda a construção e defesa da governabilidadeDemocrática com a defesa dos governos.A governabilidade refere-se a qualquer governo.Seja de que partido for.Seja qual matiz ideológico professe.O estado democrático de direito, do art. 1º da constituição, comQuem temos compromisso, é mais do que um dogma.É mais do que um dever ser.É um fazer.É uma tarefa cotidiana.A democracia não é um datum.É um constructo diário de todos nós, presente em toda linha deSentenças e acórdãos.7A democracia precisa de efetividade.A efetividade da democracia se assegura preservando-se aGovernabilidade democrática.Preservando nossas instituições.Preservar não como passado, mas como presente do futuro.Senhoras e senhores,Falamos em dois âmbitos dessa governabilidade democrática:

= a política e

= a econômica.

O supremo desenvolve seu paradigma em duas frentes:

= das relações institucionais e= da jurisprudência.

Quanto à jurisprudência, o paradigma da governabilidadeDemocrática política aparece, com nitidez, e isso foi ressaltado, inúmeras

Vezes, pelo ministro celso de mello. Aparece com nitidez:

= no julgamento de congressistas;

= nas demandas relativas às comissões parlamentares deInquérito;

= nas demandas sobre políticas públicas;

= sobre direitos eleitorais…

Nas relações institucionais, está o diálogo autônomo do supremoCom os demais poderes, a construção da governabilidade democrática política:

= firmamos o “pacto pela justiça”;

= negociamos, nos corredores do congresso, como deve fazerO presidente do supremo, a formulação de uma nova legislaçãoProcessual.

Lá estão 26 projetos, dos quais 3 já são leis. NegociaçõesEssas que se travaram dentro do gabinete de vossa excelência como,

Também, junto às lideranças políticas do congresso nacional, quer do Senado, quer da câmara.

= discutimos orçamento, demandamos a lei deResponsablidade fiscal junto ao ministério do planejamento;= obtivemos, senhor presidente, depois de longo caminho, aFixação do teto remuneratório nacional, débito que temos, nós, aoCongresso e ao senhor presidente da república, em reunião que seRealizou em seu gabinete.

= buscamos uma solução para o problema dos precatórios,Que aflige milhares de brasileiros e governantes e que representamDébito, hoje, de r$ 63 bilhões.No poder judiciário, essa governabilidade política no âmbitoInstitucional, desenvolveu-se com a intensificação do diálogo.A intensificação do diálogo comOs tribunais superiores – com o superior tribunal deJustiça, com o tribunal superior eleitoral, com o tribunal superiorDo trabalho, com o superior tribunal militar, com os tribunais de

Justiça, com o colégio de presidentes de tribunais de justiça, comOs presidentes dos tribunais regionais federais do trabalho, com asAssociações de classe, federais, trabalhistas e nacional.Demos ênfase, nesse debate, à reforma interna do sistema:

= à sua gerência eficaz.

Sem judiciário acessível, previsível e ágil, inexisteGovernabilidade democrática.Quando falamos de previsibilidade, não nos referimos,Propriamente, a resultado de julgamentos, sempre relativamente incerto,

Considerando a natureza da prova e a ambigüidade legal decorrente daRepresentatividade maior do congresso nacional. Relativamente incerto,

Portanto, em vista de peculiaridades concretas.Falamos, isto sim, de casos idênticos, que não podem receberSoluções diferentes, antagônicas.Falamos das regras do jogo – da lei – porque servimos ao cidadãoPara assegurar que suas condutas futuras terão um tipo de resposta peloSistema judiciário nacional .Falamos de critérios de julgamento, que não podem serImprevisíveis ou voluntaristas.Já o paradigma da governabilidade democrática econômica impõe umaGrande cautela ao supremo.Trata-se de decisões de alto impacto.

Impacto e, observem bem, não no bolso de cada um, mas naEstabilidade econômica de todos.Tudo porque somos uma nação que ainda está em busca de umDesenvolvimento econômico mais justo, mais equilibrado e mais sustentável.O supremo, com esse paradigma, enfrentou as demandas referentesAos planos econômicos, aos diversos planos econômicos que tivemos com aRedemocratizaçaõ, à crise energética, às privatizações…A defesa da legalidade constitucional tem exigido do supremo umIntenso trabalho de ponderação de interesses econômicos conflitantes.Interesses, no mais das vezes, agressivamente conflitantes.Quer o interesse individual, de setores, quer o conflito com osInteresses do futuro da nação.A legalidade constitucional estará sólida e sustentável, senhorPresidente, quando sustentável estiver a economia.Não qualquer economia.Mas economia pautada pela distribuição eqüitativa dos frutos deUm crescente desenvolvimento econômico.Não conquistaremos tal desenvolvimento sem que consolidemos aGovernabilidade econômica.Não simplesmente ou apenas governabilidade econômica.

Mas uma governabilidade econômica com adjetivos.Uma governabilidade democrática para uma economia democrática, naQual todos tenham acesso aos ganhos de nossa produção.Esse é o desafio do presente para jorrar no futuro.Que as mazelas, que os ódios, que as retaliações, que asIncompreensões do presente, no debate político nacional, não frustrem asObrigações de nossa geração com o futuro do brasil.Caros amigos,Ao abrir o ano judiciário, formulo uma proposta simples.É, ao mesmo tempo, permitam-me, um testemunho da minha atuação noSupremo, que já caminha para o final.O critério maior

= para que o estado democrático de direito saia do texto;

= para que o estado democrático de direito ganhe as ruas,

As escolas, as empresas, o meio rural, os sindicatos;

= para que o estado democrático de direito envolva a todos– os “joão com nome” e os “joão sem nome”;

O critério maior é a preservação da governabilidade democrática,Política e econômica.

É o que determina o amor que sentimos ao nosso país e à bravaGente brasileira.

Gente que trabalha, chora, ri, dança, ama, educa seus filhos eQue sempre precisa do direito, da justiça, dos juízes.

Muito obrigado.