A possibilidade de flexibilização das regras que regem a relação de emprego, prevista no texto constitucional, não alcança os chamados direitos indisponíveis dos trabalhadores. Sob essa tese, a Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho deferiu recurso de revista interposto contra cláusula de acordo coletivo que dispensava o empregador do pagamento do aviso prévio e reduzia o percentual da multa sobre o saldo do FGTS. O relator da matéria no TST foi o juiz convocado Vieira de Mello Filho.
“Ainda que se admita no Direito do Trabalho certa margem de flexibilização, fundada na autonomia coletiva privada, em que se permite a obtenção de benefícios aos empregados com concessões mútuas, as normas que possibilitam a referida flexibilização não autorizam, como objeto de negociação, reduzir direitos indisponíveis dos empregados”, afirmou Vieira de Mello Filho ao deferir o recurso interposto no TST pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) da 10ª Região(Distrito Federal e Tocantins).
A controvérsia remonta a fins de 1997, quando a Sitran Empreendimentos Empresariais Ltda foi derrotada no processo de licitação em que buscava a manutenção da sua condição de prestadora de serviços no Senado Federal. Diante desse fato, a empresa firmou acordo rescisório de trabalho com o Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio e Conservação de Brasília.
Segundo o acordo, os contratos de trabalho seriam rescindidos em 1º de dezembro de 1997 e o aviso prévio seria considerado como cumprido entre o período de 02/11/97 e 1º/12/97. Também foi acertado que o pagamento da multa por dispensa arbitrária seria de 20% sobre o saldo do FGTS.
Um grupo de empregados insurgiu-se contra o acordo e ingressou na Justiça do Trabalho do Distrito Federal, onde a primeira instância reconheceu a validade do acordo, o mesmo acontecendo junto ao Tribunal Regional do Trabalho. “A Constituição Federal de 1988 alçou os Sindicatos à condição de guardiães dos interesses da categoria, dando-lhes legitimidade para transacionar os direitos da classe, conforme o preceito insculpido no art. 8º, III, da Carta Magna”, registrou o Acórdão de segunda instância.
“Dentro de tal contexto, legítimo o procedimento de concessões recíprocas operado pelo sindicato da categoria dos autores e a empresa, concernente a estabelecer parâmetros para a despedida sem justa causa dos empregados”, acrescentou a decisão regional.
Durante o exame da questão no TST, a Quarta Turma reconheceu, inicialmente, a competência do MPT para figurar como parte na demanda a fim de defender direitos irrenunciáveis dos trabalhadores.
No exame de mérito, Vieira de Mello Filho reconheceu que o texto constitucional buscou privilegiar o entendimento direto entre patrões e empregados e, como reforço à negociação coletiva, passou a admitir a flexibilização das normas trabalhistas, por meio de acordo ou convenção coletiva. Por essa via, segundo o relator, a Constituição possibilita a redução de salários, diminuição da jornada de trabalho e a adoção de turnos de revezamento superiores a seis horas.
“Todavia, na presente situação não se divisa a possibilidade do sindicato firmar acordo coletivo, eis que o fez renunciando a direitos indisponíveis dos empregados, em especial a concessão de aviso prévio e multa do FGTS, hipótese que não se enquadra na flexibilização constitucional”, esclareceu Vieira de Mello Filho ao conceder o recurso e, com isso, condenar a empresa ao pagamento da diferença da multa do FGTS e o valor do aviso prévio ao grupo de trabalhadores.