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STJ reconhece possibilidade de revisão de cláusula de contrato já quitado

É possível discutir judicialmente a legalidade de cláusulas de contrato de adesão que já tenham sido cumpridas. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça e foi tomada no recurso da indústria de cutelaria Açonobre Manufatura de Metais Ltda., de Caxias do Sul (RS), contra o Banco Meridional. A empresa utilizou crédito bancário em contratos vinculados entre si. Honrou todas as dívidas. Mas, inconformada com os valores cobrados, ingressou com ação ordinária de cobrança para rever as cláusulas contratuais e discutir as estipulações relativas a índices de correção monetária, juros, comissões, multas e tarifas sobre as operações.

Relator do recurso, o ministro Ruy Rosado de Aguiar afirmou que não é pelo fato de cumprir com sua prestação prevista em contrato de adesão que a empresa fica proibida de discutir a legalidade da exigência que lhe foi feita. “Se não for assim, estará sendo instituída uma nova condição da ação sobre direito contratual: ser inadimplente. O princípio, se aceito, seria um incentivo ao descumprimento dos contratos, tão valioso que seria elevado à condição de acesso ao Judiciário. Além disso, submeteria o devedor à alternativa de pagar e perder qualquer possibilidade de revisão, ou não pagar e se submeter a todas as dificuldades que decorrem da inadimplência”, afirmou o ministro.

Na ação, a empresa afirmou que quando questionava os cálculos, o banco limitava-se a “tergiversar e a fornecer o quantum final sem maiores esclarecimentos”. “Os empréstimos contraídos nunca eram claros quanto aos encargos que sobre eles incidiam, mesmo porque, não raras vezes eram assinados em branco e, por isso, a fixação do montante cobrado a título de juros, correção monetária e demais custos e encargos ficava a cargo exclusivo do banco. A empresa somente tomava conhecimento do quanto devia quando era cobrado o respectivo valor, já que a cópia do contrato somente lhe era entregue mediante insistência e, freqüentemente após seu vencimento e liquidação” afirmaram os advogados da Açonobre.

A ação foi julgada procedente em primeiro grau, mas a Décima Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça a extinguiu por considerar que o adimplemento integral do contrato não permite sua revisão. No recurso ao STJ, a Açonobre invocou o Código de Defesa do Consumidor (CDC, art.6, V), que permite revisão de cláusula abusiva e sustentou a possibilidade jurídica de revisão dos contratos findos, uma vez que quitou o débito para evitar a alegação de inadimplência.

O ministro Ruy Rosado de Aguiar reconheceu a possibilidade de aplicação do CDC ao caso. “Este Tribunal já firmou o entendimento de que o Código de Defesa do Consumidor se aplica aos contratos bancários e a autora da ação, embora uma pessoa jurídica, utilizou-se dos serviços bancários como uma consumidora, e não pode se lhe pode negar invocar esse dispositivo”, afirmou. O relator do recurso afirmou que a empresa tomou a atitude recomendável ao cumprir o contrato e só depois questioná-lo na Justiça.

“Especificamente, em se tratando de cumprimento de obrigações cambiais ou bancárias, previstas em contrato de adesão, com garantias e sanções, entre as quais a prisão civil, a expropriação forçada de bens dados em garantia e a inscrição em banco de dados de inadimplentes é muito comum e até recomendável que o devedor efetue o pagamento da sua prestação, para evitar os males conhecidos e que não são pouco, mas isso não poderá significar a perda do direito de discutir a validade da exigência feita”, concluiu Ruy Rosado de Aguiar, ao determinar que o TJ/RS prossiga no julgamento da ação. Seu voto foi seguido pelos demais ministros da Quarta Turma.

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