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STJ discute critério para definir regime de bens do casamento

Determinar o regime de bens do casamento é sempre uma tarefa difícil para os noivos, principalmente, quando um ou os dois possuem muitos bens. Ainda mais difícil é determinar o regime dos bens quando o casamento já foi celebrado e sem qualquer tipo de pacto pré-nupcial. A questão está sendo julgada na Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça. W.H., ex-marido de L.B., pede que os ministros declarem a comunhão total de bens como o regime de seu casamento, determinado no Brasil na época em que o casal oficializou a união (1975). Já a ex-mulher defende a comunhão parcial, indicada pela lei do local onde os dois se casaram, a Flórida, nos Estados Unidos. O relator, ministro Ari Pargendler, votou em favor de L.B., indicando a comunhão parcial. O ministro Carlos Alberto Menezes Direito divergiu do relator acolhendo o pedido de W.H. para determinar a comunhão total dos bens. O julgamento foi interrompido pelo pedido de vista da ministra Nancy Andrighi.

L.B. e W.H. foram apresentados em meados de 1957, em São Paulo. Quase 20 anos depois, em abril de 1975, os dois se reencontraram, só que na Flórida (EUA), onde L.B. morava desde seu primeiro casamento, com R.J.R., falecido em 1968. L.B. e W.H. se casaram três meses depois do reencontro, nos Estados Unidos. Após as núpcias, em agosto, o casal partiu para o Brasil, onde fixou residência.

Com o casamento e a previsão de mudança para o Brasil, W.H. se comprometeu com L.B. de que, assim que chegassem ao seu país, ele doaria à esposa dois apartamentos compatíveis com o padrão residencial que ela desfrutava nos Estados Unidos, já que teriam se casado sob o regime de separação total de bens. Após alguns meses morando no Brasil com a esposa, W.H. iniciou uma série de negócios imobiliários, solicitando, inclusive, que L.B. lhe passasse procurações para que ele pudesse administrar os bens da esposa – sempre destacando que eles estariam sob o regime de separação total.

Em 1990, após uma convivência de 15 anos, o casal resolveu se separar e, com o processo de partilha dos bens, veio a surpresa: W.H., que durante toda a vida conjugal se declarava à sociedade como casado com separação total de bens, afirmou que, pela inexistência de um pacto antenupcial, deveria ser indicado o regime vigente no Brasil à época do casamento – o da comunhão universal de bens, e não o vigente nos Estados Unidos, da comunhão parcial.

Inconformada com a atitude do ex-marido, L.B. entrou com uma ação para que a Justiça declarasse como regime do seu casamento o do local da cerimônia – a separação parcial dos bens. No processo, L.B. afirmou que o ex-marido “usou e abusou das procurações, praticamente dilapidando quase todo o seu patrimônio”. A ex-mulher lembrou que, na época da união, W.H. tinha um considerável patrimônio recebido em herança, e que, após o casamento, passou a vender tudo o que herdara ganhando muito dinheiro, mas reinvestindo mal os valores.

L.B. também destacou que durante toda a vida W.H. se declarou casado em separação total de bens, tendo, inclusive, registrado um “pacto pós-nupcial” reinterando o regime adotado na união dos dois. E, agora, “após dilapidar todo o seu patrimônio”, o ex-marido vem declarar-se casado sob a comunhão universal – tudo para levar à partilha os bens da ex-mulher adquiridos antes da união, ou mesmo após, por doação ou herança, aos quais jamais teria direito pelos regimes da separação total ou parcial.

O Juízo de primeiro grau rejeitou o pedido de L.B. entendendo que o primeiro domicílio conjugal dos dois seria o Brasil e isso definiria o regime de bens – na época o da comunhão total. L.B. apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que aceitou seu pedido. De acordo com o TJ/SP, ao aceitar a celebração do casamento nos Estados Unidos, onde sua esposa morava, W.H. “recebeu como seu o domicílio da mulher, tornando-o comum”. E isso determinaria a incidência do regime legal daquele país – o da comunhão parcial. Com a decisão desfavorável, W.H. entrou com o recurso que está sendo analisado pela Terceira Turma.

Apesar de reconhecer a razão de W.H. quanto ao primeiro domicílio do casal – não sendo os Estados Unidos, e sim, o Brasil -, o ministro Ari Pargendler, relator do processo, votou mantendo a decisão do Tribunal de Justiça pelo regime de separação parcial de bens. “O primeiro domicílio conjugal não foi o do lugar onde celebrado o casamento, porque nele os cônjuges não estabeleceram a sua residência com ânimo definitivo”, enfatizou Pargendler, que justificou a manutenção do entendimento do TJ por outra razão. “O Tribunal reconheceu um ato que, salvo melhor juízo, não pode ser ignorado sem ofensa ao princípio da boa-fé”, pois, de acordo com as provas verificadas pelo TJ/SP – escrituras de compra e venda e até um contrato pós-nupcial – o ex-marido de L.B. “viveu todo o período conjugal agindo, de fato e de direito, perante todos com quem contratasse e, principalmente, perante a própria esposa, como se casado em regime de separação total de bens”, portanto, segundo o ministro, seria inaceitável se impor a comunhão universal, nunca desejada pelos dois.

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