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Edson Vidigal diz que cooperativismo é a saída

“O Brasil nunca esteve num momento tão propício ao cooperativismo, como idéia e prática, que deve se alastrar pelo país, como este que vivemos agora. Lá de fora, o capitalismo em sua nova cara, globalizado, cobra da América Latina uma segunda rodada de reformas institucionais, indispensáveis ao aporte seguro de novos investimentos. E sem esses investimentos, nesse cenário globalizado, não chegaremos ao que precisamos em termos de desenvolvimento.

Por isso, estamos vivendo o tempo certo para a implementação, para o crescimento, do cooperativismo no Brasil. É preciso procurar urgente um caminho de solução para os nossos problemas, principalmente os de ordem econômica, geradores da violência e das injustiças sociais. E não existe outro a trilhar, senão investir no cooperativismo como saída eficaz e urgente.”

Essa análise foi feita pelo vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Edson Vidigal, durante a Palestra Magna que proferiu na abertura do 4o. Fórum Nacional das Cooperativas de Crédito do Judiciário e Instituições Jurídicas (Fonacred), reunido em Brasília.

Segundo o ministro, o Estado brasileiro ao ponto a que chegou, com o orçamento público comprometido em quase a metade para o pagamento de juros domésticos e internacionais, sobrando para tocar a administração pouco mais de 10% do previsto, não tem como responder às necessidades de investimentos na saúde, em estradas, saneamento e outras, o que o obriga, a cada nova demanda, a gerar um novo imposto.

O vice-presidente do STJ prosseguiu lembrando que quanto mais impostos forem criados, nada será suficiente para mudar o quadro. As demandas sociais não são atendidas, os programas não decolam, tudo porque não há verbas, embora haja previsão orçamentária e o país espera por reformas.

Reformas tímidas

Para o ministro Edson Vidigal, entretanto, “a pauta das reformas é tímida e parecemos não estar convencidos de que o país não precisa de emplastros e sim de reformas profundas, consistentes, reformas de base. Reforma do modelo federativo, reformas em toda engrenagem do Estado, reformas políticas, nas leis eleitorais, processuais, civis, penais, reformas no sistema penitenciário, na segurança, na saúde, na educação. E enquanto não nos convencemos dessas urgências, vamos escapando com vida, precariamente, nesse redemoinho de incompreensões”.

“Enquanto o Fundo Monetário Internacional, que no dizer Mary O’Grady, editora do The Wall Street Journal, não consegue se reencontrar – porque “perdió la brújula” (perdeu a bússula) – vemos os países da América Latina engolfados na crise das dívidas, dos juros altos, da paralisia econômica, sem crescimento e todas as cobranças sociais. E a receita do FMI é a mesma para qualquer situação em qualquer país” – continuou.

O ministro frisou que, “dos juros altos queixam-se todos e a inadimplência se generaliza também entre os assalariados. Do que o país deve ao exterior, uma parte substancial é atribuída ao setor privado, incluídas aqui grandes empresas internacionais. E o refinanciamento dessa dívida é quase impossível tamanha sua vinculação à moeda estrangeira”.

Para Vidigal a resposta é o cooperativismo, “semente da verdadeira democracia, porque ali os juros não dependem de decisões do Copom, sendo ditados pelos próprios cooperados”.

“Nossas obrigações com o exterior representam pouco mais de 20% (vinte por cento) da dívida do setor público como um todo (União, Estados, DF e Municípios). O que pesa é a dívida interna. Aqui, temos 80% (oitenta por cento) da dívida pública amarrada a prazos mais curtos e a juros mais elevados. Está nos bancos e nos fundos de pensão. Renegociação quase impossível”.

O ministro acrescentou que “fala-se que o déficit da previdência social chegará a 16 bilhões de reais este ano e que, incluindo a previdência publica, chegaremos a um déficit total de 62 bilhões. Não são números confiáveis porque não são os mesmos em todas as fontes. Mas todos eles são graves, assustam e preocupam”.

Cooperativismo é a resposta

Prosseguindo em sua análise o ministro Edson Vidigal acrescentou que, nos últimos três anos, a taxa de juros reais nos mercados emergentes (México, por exemplo) ficou entre 2% e 3%. No Brasil, 10%. Não é segredo que há uma transferência brutal de renda para o setor financeiro. Dados do PIB do ano passado dizem que os bancos ficaram com 8,61% de todas as riquezas nacionais, ou seja 30% a mais do que os 6, 58% de 2001.

“No setor tributário, outro escândalo – continuou. De cada doze meses de trabalho, o dinheiro de três meses é para pagar impostos, taxas, contribuições. Entre todos os países da América Latina, o Brasil é o de maior peso na cobrança de tributos, taxas e contribuições. Temos 54 milhões de pessoas na linha de pobreza, um grau de desigualdade dos mais altos nas últimas décadas”.

E o ministro prosseguiu: “Estima-se que mais de 67 mil trabalhadores rurais vivem acampados em barracas de lona, nômades como camelos desgarrados de caravanas no deserto. Mas somos o 9º no mundo entre os compradores de “Ferrari”, um dos automóveis mais caros do planeta. No ano passado, retiramos 44 mil recrutas dos quartéis e os mandamos para casa, encurtando o tempo de prestação do serviço militar, por falta de verba. Mas ao contrário do que previu Léo Jaime, o mundo não vai acabar por falta de verbas. O mercado de anti-depressivos movimenta cerca de 15 bilhões de dólares por ano no mundo e no Brasil esse consumo aumentou em 40% nos últimos anos”.

Por todos esse motivos, Vidigal acha que o sistema cooperativo vem como resposta imediata às dificuldades vividas pelo Brasil.“A democracia não se faz apenas através da edição de uma Carta Magna, mas na prática do dia-a-dia – acrescentou. E o cooperativismo permite aos seus associados exercitar essa ação democrática. Ele está disseminado no Brasil e já congrega setores fundamentais de nossa economia como a agricultura, a saúde e o turismo, somando mais de 7.500, número maior do que os 5.500 municípios existentes. O terreno é fértil, bastando lembrar que temos hoje cerca de 1.127.000 cooperativados”.

Vidigal citou como exemplo o Estado do Paraná, onde o cooperativismo, ao invés de se constituir como um mero laboratório, tem sido algo surpreendente, responsável por 13% do PIB estadual, lembrando que em 2002 o faturamento das quase 200 cooperativas do Estado atingiu mais de 10 bilhões de reais, com o destaque ficando para o ramo agropecuário, que responde por 80% desse montante.

Segundo o ministro o balanço social das cooperativas paranaenses, editado no final do ano passado, mostra a realidade do cooperativismo, pois somente em 2002, foram mais de um bilhão de reais investidos em setores como meio-ambiente, educação, lazer, saúde, capacitação e formação cooperativista.

O vice-presidente do STJ concluiu dizendo que “se o Brasil não procurar a saída de suas dificuldades no cooperativismo e no micro-crédito, iremos nos defrontar, em poucas décadas, com problemas terríveis do Estado confrontado com a grande horda dos excluídos e pondo em risco a nossa ainda tão frágil democracia”.