Um empresário do Rio de Janeiro, dono de uma corretora de valores, não conseguiu reaver depósitos de R$ 49.969,28 (valores de abril de 95) realizados na conta corrente de uma ex-namorada ainda no período em que estavam juntos. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que concluiu ter havido doação e não empréstimo. “A lei admite que os presentes dados como prova de estima, como parece ser o caso dos autos, chamados de doações manuais, sejam realizados verbalmente”, esclareceu o relator do processo, ministro Antônio de Pádua Ribeiro,
J.P.G. afirma que fez vários depósitos na conta bancária da advogada M.A.L., durante os dois anos de namoro, de 1992 a março a 94, sem documento formal (contrato verbal de mútuo), para que ela adquirisse um carro importado e acabasse de pagar o financiamento de um Santana. A ex-namorada nega essa versão e diz que recebeu de presente de Natal US$ 18 mil (“doação de namorado livre à namorada livre”) em 1993, equivalente a 33,9% do preço pago pelo veículo Pajero, da Mitsubishi, e que era seu o dinheiro dos demais depósitos bancários, cujos recibos foram apresentados por ele como prova.
Na sentença de primeiro grau, a advogada foi condenada a pagar o valor cobrado pelo empresário. “Empréstimo é possível sem documento, doação, não”, concluiu o juiz Camilo Ribeiro, da 3ª Vara Cível do Rio de Janeiro, ao interpretar dois artigos (1.165 e 1.168) do Código Civil, que estabelecem a obrigatoriedade de as doações serem acompanhadas de um contrato formal. A lei admite doação verbal quando se trata de bens móveis e de pequeno valor, mas o juiz entendeu não ser esse o caso.
Ao julgar apelação de M.A.L., o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro julgou ter havido doação, por não haver prova de que os depósitos bancários tenham sido feitos com o dinheiro do empresário. Ao contrapor-se à sentença, o relator do processo no TJ, que não admitiu a doação verbal por considerar o valor alto, o desembargador Gustavo Leite segue o jurista Washington de Barros Monteiro que ensina que o pequeno valor é relativo e dependente da fortuna do doador. “Se este é pessoa abastada, mesmo as coisas de valor elevado podem ser doadas através de simples doação manual”, afirma. O relator ressalta ainda que o empresário costumava ser magnânimo nos presentes, “pois até com vestido de US$ 2 mil presenteou a namorada”.
“Na verdade, o que me parece é que, rompida a relação amorosa, o sentimento de amor, ultrajado e ferido, agora amargo, transforma-se em sentimento de repulsa e desprezo, sobre os quais poetas e dramaturgos tanto já escreveram, resultando, então, nesta investida que, contudo, há de ser repelida por absoluta ausência de prova da existência não só do contrato de mútuo como, ainda, de ter o autor (J.P.G) depositado dinheiro na conta-corrente da ré”, conclui. Para provar que o empresário não se conformou com o rompimento, M.A.L. havia apresentado à Justiça bilhetes dele, encaminhados a ela depois do fim do namoro, nos quais ele mesmo se classifica de “mala sem alça” e, posteriormente, “uma grande mala sem alça”.